Recuperação de área usando PANC (ou minha Micro-Agrofloresta)
Vida Saudável

Recuperação de área usando PANC (ou minha Micro-Agrofloresta)


Minha família tem uma casinha em Itu com um terreno muito pobre, árido e pedregulhento, onde nunca conseguimos colher muita coisa. Convivendo com permacultores e pessoas inspiradoras, resolvi colocar em práticas tudo que aprendi a respeito de cultivo consorciado pensando na formação de uma agrofloresta. Claro, privilegiei espécies não convencionais rústicas, de crescimento rápido e intenso, que me desse uma ajuda para melhorar o solo e recuperar a área.

Resolvi colocar a mão na massa em uma área pequenina, de uns 5 metros de largura por 8 de comprimento. Comecei afofando a terra, fazendo valas e removendo as pedras. Fiz algumas curvas de nível porque o local é íngreme, usando o método de fazer valas e cobrir tudo com muita matéria e troncos cortados. A terra era tão esturricada e erodida que não nascia nem mato, então não tive que cortar, salvo por uma ou outra braquiária agonizante. O local foi uma plantação de eucalipto e sofre capinas rotineiras pelos últimos 15 anos, e toda parte boa do solo se perdeu.  Apenas uma leucena estava no local e foi podada e usada como matéria orgânica. Bananeiras dispensadas pelo vizinho, serragem, folhas varridas e aparas de grama também foram usadas.

Priorizei a adubação verde com leguminosas como o feijão de porco, orelha de padre e feijão guandu, além de nabiço, milhete e sorgo. Usei também mucuna, margaridão e crotalária, não comestíveis, mas muito eficientes. Conforme elas cresciam, plantei tagetes e huacatay, que repelem nematóides do solo e atraem polinizadores. E as flores, zinnia, cosmea e chanana para ficar com cara de jardim, e não de mato. Plantei ainda plantas de porte baixo para cobrir a área rapidamente - a minha ideia é um plantio de baixo porte, aproveitando a graviola, o mate, a anona, o sabugueiro e o guanandi que já existem lá. Para cobrir o solo, grama amendoim, boldo rasteiro, batata doce, abacaxi, fisális e trapoeraba. Aqui e ali, o que sobreviveu: milho crioulo e mandioca. Coloquei aromáticas: alecrim, manjericão, alfazema, vetiver, boldo e cidreira.

Não sei se posso chamar de agrofloresta porque o manejo foi pouco, apenas desbastei os adubos verdes nas épocas certas, podei a leucena mensalmente para que não cobrisse tudo e controlei as trepadeiras. Seria mais um plantio misto e aleatório de espécies - tive que me ater às que sobreviveriam, não necessariamente as que eu queria. Se colhi muita coisa? O feijão de porco foi o mais abundante, a mucuna também. A mandioca deu uma colheita pouca, a batata doce estava pequena, mas as folhas foram bem aproveitadas. O mangalô seco ficou cheio de caruncho, mas as vagens verdes estavam ótimas, e o milho foi atacado por besouros, mas rendeu uma pipoquinha. Os pés de mamão secaram e morreram. O guandu rendeu quilos e quilos de ervilhas, e o cará-moela, muitas batatinhas. Das ervas, deu pra colher picão, guasca a alguns amarantos, além de muito huacatay. Mas não desisto. Semeei fedegoso e jurubeba, para espantar ainda mais os insetos indesejados. E continuo cuspindo sementes de frutas e legumes. As árvores nativas vão aparecendo, e vou deixando. Não sei nomear, não sei o que são, mas já são vitoriosas de escolherem um local tão precário pra crescer.

Se o que fiz é considerado produtivo? Não sei. Não gastei um centavo com mudas e sementes, todas colhidas, ganhas ou trocadas em pic nic de trocas. Não usei adubo nenhum, os microorganismos capturei na mata. Investimento zero. Não segui os protocolos dos grandes figurões da agroecologia, mas ao menos, deixei a terra respirar. 

Não daria para viver com as coisas dali, claro, porque a área é pequena e a energia que dediquei, pouca. Mas o trabalho foi apenas arrumar o solo, plantar, podar muito raramente e não regar nunca, ou seja, gastei poucas horas de trabalho e a natureza respondeu bem, além de não ter quase usado água. Com mais manejo, mais matéria orgânica, seleção boa de espécies, com menos negligência, acho que o resultado seria melhor. A "agrofloresta" sobreviveu a dois meses sem chuva, está num solo ácido e pedregulhoso altamente compacto. Está indo, linda. Fico feliz de saber que o solo melhorou, está mais fresco, úmido, e mais vivo com as aplicações mensais de microorganismos eficazes. 

Apesar dos apesares, é um exemplo de que sim, é possível fazer um cultivo praticamente do zero, com custo zero, usando apenas PANC e espécies comestíveis, livrar-se das braquiárias e dos capins, melhorar o solo e dar vida para onde é apenas pedra. Sei que o solo melhorou porque antes, mesmo as PANC mais resistentes não nasciam por aqui, e encontrei já picão, beldroega e guasca nascendo. A tanchagem ainda não encontrou espaço, e espero que os carurus venham também. Semeei tudo que encontrei pela frente, que vença o melhor. Quero aproveitar os estágios mais iniciais da sucessão para entender quais PANC gostam mais de cada ambiente. De qualquer forma, pensando que a agrofloresta tem pouco mais de um aninho de vida, muita coisa está por vir.


O terreno era assim. A agrofloresta fica localizada à
esquerda, numa área ociosa em frente às hortas.
Usei pneus, não uso mais. Foto em outubro de 2014,
já com a cobertura de matéria orgânica e poda.
Num segundo momento, vista de baixo,
já com cinco meses de idade. Feijões trepadeiros
predominam, nascem crotalárias, batata doce e guandu.

Agrofloresta com setes meses. Bertalha, mangalô e
cará moela subindo nos fios que coloquei.
Mais tempo depois, com nove meses.
Amaranto, mandioca, girassol, mucuna e mangalô.
Com 10 meses, já não há solo descoberto.
Um caos de trepadeiras e flores, em plena estiagem.
Agora, com 13 meses, o caminho quase fechou. As
aromáticas cresceram, assim como mudas nativas de
alecrim do campo e orelha-de-onça. Tive
um boom de tagetes e suprimi os feijões. As mandiocas,
margaridão e guandu passam dos dois metros.
Canteiro visto de baixo. Agroecologia ensinando sempre!
Muita vida, muita cor, muito cheiro.
As flores - para a mãe achar graça e o pai
não achar mato. Afinal, se é bonito, "não é mato".
O plantio inicial de coquetel de sementes em consórcio
com milho. Crotalária, mucuna, mangalô, guandu,
feijão de porco, tagetes, cosmos, zinnia, batata doce.
Tudo coberto com quase um palmo de folhas e galhos.
Que vença o melhor!

Lista de plantas comestíveis que usei para iniciar a cobertura (em consórcio com outras espécies, claro):

Plantas de Porte baixo para recobrir a área rapidamente
Batata Doce (vários tipos)
Trapoeraba Roxa
Boldo rasteiro

Adubos verdes, para fixar nitrogênio e fornecer biomassa
Amendoim
Gergelim
Nabo Forrageiro
Fedegoso
Feijão Orelha de Padre
Guandu
Leucena
Feijão Espada
Feijão Adzuki

Fontes de carbono e biomassa
Jurubeba
Milhete
Sorgo

Fontes de flores, biomassa e de ciclo curto
Tagetes
Huacatay
Fisális
Picão
Chanana
Caruru
Guasca
Serralha
Capiçoba
Amarantos
Tansagem
Espinafre africano (amaranto)

Plantas rústicas comestíveis diversas
Gravatá
Sabugueiro
Chaya
Inhame
Ananás
Cará Moela
Capim-santo
Cidreira de árvore

Não Comestíveis
Margaridão
Mucuna
Zinnia
Cosmea
Crotalária



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