Vida Saudável
Cará-moela: ensaio
Tem cará-moela de todas as formas. Enrugado, liso, de superfície lunar. Forma de pedra, forma de asa, forma de beijo, forma de borboleta, forma de moela.
Se tem carás-guardados, é hora de dar uma olhada: a vida está transbordando em brotos verdes, incipiente, mas ainda vida. A casca rugosa daquele que nasceu no ar pede "me leve para conhecer a terra". Daí em diante, será brotar para voltar ao ar, mas de outra forma. O mito da ressurreição vegetal. Do ar, para a terra, para o ar. Eternamente. Setembro chegando, a vida acorda.
O Cará Moela, ou Dioscorea bulbífera, é uma das poucas plantas que produzem bulbilhos aéreos, ou seja, batatinhas que nascem fora da terra, presas aos galhos, feito jabuticabas. Trazida da África, a maior parte das espécies que existem no Brasil são cultivadas, ou seja, são comestíveis. As espécies não cultivadas são venenosas e muito amargas, requerendo uma preparação complexa. As nossas, por sorte, são adocicadas, com aroma de batatas e castanhas, farinhentas e cremosas. Para cozinhar, basta jogar na panela com água fervente, com pele e tudo, e esperar amaciar. A pele solta fácil e a batata é resistente: mantém a forma mesmo cozida.
Depois de dormir por meses nessa forma de pedra, ela rebrota muito rápido, crescendo mais de 10cm por dia quando começam as chuvas, podem cobrir uma cerca, uma árvore ou um muro em poucas semanas.
Ele gosta de solos férteis e úmidos, mas vai bem em solos mais secos. O importante é ser fértil, e se possível, bem adubado com humus, composto ou esterco. Mas se não tiver, tudo bem. Cresce em qualquer parte do Brasil, mas é sensível a geadas. Se a temperatura noturna cai abaixo dos 12ºC, a planta seca imediatamente, mas as batatinhas ainda podem ser colhidas. Também é sensível a granizo, que arranca prematuramente as batatinhas do pé e rasga as folhas largas, destruindo a planta em poucos instantes. Caso haja granizo ou a planta seque, não se preocupe: ela é caprichosa e rebrota no ano seguinte, porque debaixo da terra o bulbo só cresce, parecido com um cará normal.
A mesma planta produz vários tamanhos de cará-moela: pequenos, médios e uns muito grandes, com mais de 300gr cada. Os meus não ficam tão grandes, mas os dois maiores da foto, que ganhei da amiga Paula Navas e crescem na úmida serra do mar, ficam enormes. Devem ser colhidos quando ficam soltos e caem naturalmente, ao mais simples toque. Por dentro, pode ser roxo, amarelo, branco ou alaranjado, liso ou rajado. Por fora, todos iguais, só cozinhando pra saber.
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Formatos diferentes, tipos diferentes. O em forma de borboleta tende a ser mais cerrilhado, mas não é regra. |
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Todos os tamanhos: de 300gr a 1gr. |
Encontrei por aí dois formatos principais: o que começa nascendo em forma de borboleta e o outro começa nascendo em forma de bolota. Depois de crescidos, ficam muito parecidos - mas dá para saber que são variedades diferentes.
Se ainda não tem o seu, procure na internet, em lojas ou com amigos. Chegada a primavera, as batatinhas magicamente despertam e começam a procurar luz, enrolar, soltar ramas e folhas. Não adianta - se não plantar cará-moela agora, só vai encontrá-lo ano que vem, no inverno. Os meus eu sempre fico com dó de consumir e acabo plantando, e em breve terei uma verdadeira floresta de cará-moela e uma boa safra, se não tivermos geada ou granizo. Das plantas não convencionais, acho de longe a mais bonita e intrigante: achei que ela merecia um ensaio próprio. Sim, sou jardineiro babão nas minhas crias...
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